"Não tenho ambições nem desejos, ser poeta não é uma ambição minha. É minha maneira de estar sozinho". Fernando Pessoa

sábado, 2 de outubro de 2010

Me Deixe Mudo




Não me pergunte
Não me responda
Não me procure
E não se esconda
Não diga nada
Saiba de tudo
Fique calada
Me deixe mudo
Seja num canto
Seja num centro
Fique por fora
Fique por dentro
Seja o avesso
Seja a metade
Se for começo
Fique à vontade

(Walter Franco)

"Versos íntimos" - Augusto dos Anjos

Motivo


Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno e asa ritmada.
E sei que um dia estarei mudo:
- mais nada

(Cecília Meireles)

DECADÊNCIA


Iguais ás linhas perpendiculares
Caíram, como cruéis e hórridas hastas,
Nas suas 33 vértebras gastas
Quase todas as pedras tumulares!

A frialdade dos círculos polares,
Em sucessivas atuações nefastas,
Penetrara-lhe os próprios neuroplastas,
Estragara-lhe os centros medulares!

Como quem quebra o objeto mais querido
E começa a apanhar piedosamente
Todas as microscópicas partículas,

Ele hoje vê que, após tudo perdido,
Só lhe restam agora o ultimo dente
E a armação funerária das clavículas!

(Augusto dos Anjos)

domingo, 20 de junho de 2010

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Sob o chuveiro amar


Sob o chuveiro amar, sabão e beijos,
ou na banheira amar, de água vestidos,
amor escorregante, foge, prende-se,
torna a fugir, água nos olhos, bocas,
dança, navegação, mergulho, chuva,
essa espuma nos ventres, a brancura
triangular do sexo -- é água, esperma,
é amor se esvaindo, ou nos tornamos fontes?
(Carlos Drumond de Andrade)

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Palavras escritas...



A minha palavra diz que ama a sua palavra.
A sua palavra diz que ama a minha palavra.
Que tal casarmos as nossas palavras.
Pois, apesar dos encontros e desencontros,
Dos caminhos e descaminhos,
Elas têm tudo para serem felizes para sempre.
Elas brincam.
Elas brigam.
Elas se alegram.
Elas choram...
Elas gritam aos quatro cantos que amam.
E se amam...
E se tocam...
E se beijam...
Fazem amor com carinho e desejo.
Dão bom dia, boa tarde, boa noite!
E melhor de tudo, são perpetuadas na escrita.
Poderão ser lidas, compartilhadas.
Amadas ou odiadas.
Mas, estarão lá...
Indeléveis,
Separadas ou juntas,
Mas, eternizadas
Na mente e no coração de quem as escreveu ou leu.
Na gaveta, no livro, no caderno, no arquivo de quem as escreveu,
Ou, simplesmente, as guardou.
(Mary Galdino)