"Não tenho ambições nem desejos, ser poeta não é uma ambição minha. É minha maneira de estar sozinho". Fernando Pessoa
sábado, 2 de outubro de 2010
Me Deixe Mudo
Não me pergunte
Não me responda
Não me procure
E não se esconda
Não diga nada
Saiba de tudo
Fique calada
Me deixe mudo
Seja num canto
Seja num centro
Fique por fora
Fique por dentro
Seja o avesso
Seja a metade
Se for começo
Fique à vontade
(Walter Franco)
Motivo
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno e asa ritmada.
E sei que um dia estarei mudo:
- mais nada
(Cecília Meireles)
DECADÊNCIA
Iguais ás linhas perpendiculares
Caíram, como cruéis e hórridas hastas,
Nas suas 33 vértebras gastas
Quase todas as pedras tumulares!
A frialdade dos círculos polares,
Em sucessivas atuações nefastas,
Penetrara-lhe os próprios neuroplastas,
Estragara-lhe os centros medulares!
Como quem quebra o objeto mais querido
E começa a apanhar piedosamente
Todas as microscópicas partículas,
Ele hoje vê que, após tudo perdido,
Só lhe restam agora o ultimo dente
E a armação funerária das clavículas!
(Augusto dos Anjos)
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